POR DANIELA PRADO

Pela definição dos dicionários, usa-se a palavra lixo para designar coisas ou mesmo pessoas (no intuito de ofender) que não têm mais qualquer função. Certamente muitos já ouviram a frase “lugar de lixo é no lixo”. Mas será que, na prática, essas ideias realmente fazem sentido? Por mais que se busque conscientizar as pessoas desde a infância, ainda há aquele papel de bala que a criança joga na sarjeta e vai se misturar com a água da chuva , navegando até o rio, que deságua no mar, onde estão os peixes e tartarugas que sofrerão as consequências dessa atitude. Infelizmente nem todos despertaram para essa triste realidade. São muitas as latinhas de cerveja, papéis de propaganda, embalagens de alimentos, plásticos e até lixo orgânicos jogados pelas ruas – sendo que em muitos pontos da cidade é possível encontrar cestos de lixo, ou seja, jogar essas coisas no chão é uma questão cultural.

Pensando na conscientização das pessoas para que, cada vez mais, fujam desse hábito, em São João da Boa Vista algumas iniciativas visam o correto descarte dos resíduos e incentivam essa mentalidade nas pessoas, como se, pela reciclagem, o lixo tivesse novas oportunidades e o mundo, por sua vez, se tornasse mais sustentável. A Coopermax, criada em 2003 pela Prefeitura Municipal, com o apoio da Petrobrás, realiza a coleta seletiva de papéis variados, como revistas, jornais, caixas de papelão, garrafas e frascos de vidro, plásticos que vão desde garrafas pet e recipientes de produtos de limpeza até brinquedos, além de isopor, metal e óleo de cozinha.

COLETA SELETIVA

Adrian Cristina Vidal, diretora secretária da Coopermax, explica que, ao separar o lixo para a Coleta Seletiva, é importante não misturar recicláveis com orgânicos. “Coloque plásticos, vidros, metais e papéis em sacos separados. Lave as embalagens do tipo longa vida, latas, garrafas e frascos de vidro e plástico. Embrulhe vidros quebrados e outros materiais cortantes em papel grosso [do tipo jornal] ou coloque-os em uma caixa, para evitar acidentes. Garrafas e frascos não devem ser misturados com os vidros planos”, orienta Adrian, sobre o procedimento na hora de separar seu lixo.

COOPERATIVA DE RECICLAGEM-A Coopermax, criada em 2003 pela Prefeitura, com o apoio da Petrobras, realiza a coleta seletiva em São João da Boa Vista. “A reciclagem gera oportunidade de trabalho e renda aos associados, cooperados e catadores”, explica Adrian Cristina Vidal, diretora da cooperativa (Foto: Leonardo Beraldo / Cromalux)

Ela também destaca que a coleta funciona em seis etapas: descarte, coleta, descarregamento, triagem, prensa e venda. Segundo Adrian, o caminho que o lixo reciclável percorre após o descarte do munícipe é o seguinte: o caminhão terceirizado da prefeitura efetua a coleta nos trechos separados por bairros e divididos em dias da semana (assim como ocorre no caso do lixo orgânico); ao término da coleta, os caminhões se dirigem à cooperativa, localizada no Distrito Industrial; lá o material é descarregado na rampa ligada a uma esteira própria para a seleção e separação dos materiais. A separação funciona para selecionar material específico e, logo em seguida, são prensados e estarão, enfim, prontos para venda.

“Com a reciclagem, faz-se uma grande economia de energia, poupa-se recursos naturais e ainda coloca-se novamente em circulação coisas que estariam no lixo. Geralmente as pessoas acham que o lixo não serve para mais nada, que é sujo e não vai ter nenhuma utilidade. A reciclagem veio provar que tudo se pode reaproveitar. O tempo para a decomposição de alguns produtos é muito longo e esse é mais um grande motivo para que a reciclagem seja feita em todo o mundo. O plástico, que é muito utilizado no dia a dia, leva cerca de 450 anos para se decompor, o vidro 5 mil anos, a lata 100 anos, o alumínio de 200 a 500 anos. Com a reciclagem, é possível diminuir os problemas do meio ambiente e por isso as pessoas devem se conscientizar, para que possamos ter um mundo mais saudável. Pensando pelo perfil socioeconômico, a reciclagem gera oportunidade de trabalho e renda aos associados, cooperados e catadores”, justifica Adrian.

Profissionais que hoje atuam na triagem dos produtos reciclados (Fotos: Leonardo Beraldo / Cromalux)

LAVAR OS MATERIAIS?

Existe muita desinformação com relação a limpeza dos materiais recicláveis, jornalistas, catadores, especialistas, cada um tem uma versão do que é certo. Porém, há alguns pontos que deverão ser considerados, especialmente, o fato do material demorar entre uma semana a alguns meses entre o descarte na sua casa e o processo de lavagem na empresa recicladora.

Além disso, este material será triado manualmente, por pessoas que são iguais você, possuem olfato, tato e visão. E os resíduos de alimento nos recicláveis vão dar origem a vetores como ratos, baratas, moscas e mosquitos nas cooperativas, além de sujarem os veículos. Isso sem contar que alguns materiais podem ter desconto de até 70% no seu valor de venda pela sujidade.

É sempre importante destacar que você não precisa lavar os recicláveis como se fosse a louça da sua casa, basta remover o excesso de sujeira e usar a água do enxágue da louça para finalizar a limpeza. Agora se você acha que isso é muito trabalho, imagina para quem está lidando com isso todos os dias tendo que sobreviver da venda destes materiais.

ELETRÔNICOS TAMBÉM PODEM SER RECICLADOS

Contudo, um outro tipo de produto, quando encerra sua vida útil, precisa de um descarte muito peculiar e cuidadoso: o lixo eletrônico. O grupo de extensão RETEC UNESP – Reciclando Tecnologia, surgiu em novembro de 2017 no campus de São João da Boa Vista da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Seu objetivo é contribuir para uma gestão adequada dos resíduos sólidos e descarte correto dos resíduos eletrônicos (REEs), tanto no campus como no município, por meio do envolvimento da comunidade (do campus e externa), a fim de promover conscientização e mudança de atitudes em relação aos resíduos.

Composto por estudantes, funcionários e docentes do campus, além de colaboradores externos, o RETEC UNESP conta ainda com uma equipe interdisciplinar para o desenvolvimento de suas ações. Seu Coordenador é o Profº Dr. José Augusto de Oliveira, docente dos cursos de Engenharia Eletrônica e de Telecomunicações e Engenharia Aeronáutica da UNESP, que possui experiência nos temas relacionados à Engenharia e Gestão do Ciclo de Vida de produtos e serviços industriais.

“Atualmente, as atividades do grupo envolvem a realização de processos educativos sobre o tema em escolas do município e da região, além da comunidade interna do campus; publicações em redes sociais, visando o compartilhamento de informações e a conscientização da população sobre temas ambientais e sobre REEs. Há campanhas isoladas para coleta e destinação adequadas desses resíduos; identificação das lixeiras seletivas para descarte adequado dos resíduos no campus; elaboração de materiais didático-pedagógicos para os processos educativos; participação e apresentação de trabalhos em eventos; e parcerias com a Prefeitura, a Cooperativa de Prestação de Serviços e Coopermax e empresas relacionadas à produção reciclagem de REEs, principalmente dos setores aeronáutico e de telecomunicações”, pontua José Augusto. E completa que a principal meta para 2020 é a instalação, no campus, em parceria com a Prefeitura, de um container para a coleta, armazenamento e destinação adequada de REEs provenientes de toda a comunidade sanjoanense, o que possibilitará também o estudo desses resíduos para o aprimoramento da gestão e da produção de tecnologias relacionadas, como de reutilização, remanufatura e reciclagem, por exemplo.

“É importante salientar que o RETEC UNESP – Reciclando Tecnologia não tem o objetivo econômico de vender esses resíduos, mas sim estudá-los e destiná-los corretamente”, frisa. Sobre os riscos que o descarte incorreto de eletrônicos e afins pode acarretar às pessoas e ao meio ambiente, José Augusto cita que, em 2016, segundo o relatório Global E-waste Monitor 2017, o mundo gerou 44,7 milhões de toneladas de REEs, e o Brasil ocupou a 2ª posição neste ranking, produzindo cerca de 1,5 milhões de toneladas destes resíduos – o que deixa claro que os impactos ambientais são significativos. Não ó pelo volume e tempo que levam para se decompor, mas pela possível presença de metais pesados em sua composição, os quais são altamente prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.

“Muitos destes metais são carcinogênicos [causadores de câncer], conforme podemos verificar na classificação dos grupos de substâncias químicas da Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (IARC). Se estas substâncias químicas entrarem em contato com o solo, podem lixiviar e atingir cursos d’água superficiais, como rios, lagos e mares, ou então percolar e alcançar os cursos d’água subterrâneos, que por sua vez se encontram com as águas superficiais ou se acumulam nos aquíferos que suprem grande parte da demanda hídrica de vários ecossistemas, incluindo a espécie humana. Um exemplo numérico dessa agressão é, por exemplo, uma simples bateria de smartphone, que pode poluir cerca de 60.000 litros de água”, alerta José Augusto.

Além disso, o não reaproveitamento desses resíduos na produção de novos produtos resulta na necessidade de extrair mais matéria prima do meio ambiente, contribuindo para a sua degradação e escassez.

Há muitos estudos estimando a escassez de grande parte destes metais, em poucos anos. “Evitar o aumento acelerado desse passivo em todo o mundo tem sido a principal motivação para elaboração de legislações que visem reduzir o teor das substâncias perigosas presentes nos REEs, bem como sua reciclagem e correta destinação dos rejeitos ao final de sua vida útil”, esclarece ele.

A população pode acompanhar a iniciativa nas redes sociais – Facebook e Instagram: @retec.unesp, para saber como descartar seus resíduos eletrônicos adequadamente ou solicitar palestras e informações.

PROJETO QUE RECICLA E AJUDA AO PRÓXIMO

Realizar o descarte correto dos resíduos, em alguns casos, pode ir além da preocupação com o meio ambiente e sustentabilidade, mas envolver o bem-estar de quem vive em meio a esse espaço. Camila Viana Ciancalio, coordenadora do Programa Empreender da Associação Comercial, também gerencia um projeto – desenvolvido pelo grupo de Mulheres Empreendedoras – em que o lixo eletrônico é coletado, vendido e revertido em prol do Lar São José, da Sociedade São Vicente de Paulo.

“O projeto de venda de lixo eletrônico em prol de alguma entidade assistencial já era realizado pela São João Informática desde 2012. A idealizadora do projeto foi a Angélica Almeida, proprietária dessa empresa. Nós ampliamos a coleta desse lixo, divulgamos para mais pessoas e colocamos o projeto no papel, incluindo informações específicas sobre o Lar São José e sobre a situação do idoso na nossa cidade e país”, conta Camila, sobre como tudo começou.

Por ser coordenadora do programa da Associação Comercial e Empresarial de São João da Boa Vista, que reúne empresários dos mais diversos setores em núcleos, Camila revela que um deles é o da Mulher Empreendedora, o qual realiza, anualmente, uma ação social para ajudar algum projeto já existente na cidade, através da mobilização dessas empresárias. “Em 2019, as mulheres escolheram ajudar o Asilo Lar São José a custear as despesas de um ano de padaria. A Angélica participa conosco do Núcleo da Mulher e tomou conhecimento dessa ação social. Assim, nos contatou para ampliarmos o projeto, incluindo a Associação Comercial como ponto de coleta e divulgando para mais pessoas. Como um dos objetivos norteadores do Núcleo da Mulher é contribuir com a sociedade, a possibilidade de unir a causa ambiental com a social nos pareceu o melhor dos mundos”, acrescenta.

Todas as pessoas interessadas em contribuir com esse projeto podem levar seu lixo eletrônico para qualquer um dos pontos de coleta ou, no caso de materiais muito pesados e difíceis de transportar, basta ligar na Associação Comercial, telefone (19)3634-4303 e solicitar a retirada.

Além da Associação Comercial, localizada na Rua São João, nº 237, Centro; e cujo horário de funcionamento é de segunda a sexta-feira, das 8h às 18h, outro ponto de coleta é a São João Informática, que fica na Praça da Bandeira, nº 25, Centro; e funciona de segunda a sexta-feira das 8h30 às 18h e aos sábados das 8h30 às 12h00.

LIXO ELETRÔNICO NO BRASIL- O Brasil está na liderança de produção de lixo eletrônico da América Latina. É o que afirma um estudo da Global e-Waste Monitor 2017, que avalia em todo o mundo a quantidade de sujeira criada a partir de computadores, televisores e celulares descartados, por exemplo. Na pesquisa produzida pela Organização das Nações Unidas (ONU), o país produz anualmente 1,5 mil tonelada. (Foto: Reprodução Internet)

“O Lar São José é uma instituição de longa permanência destinada a idosos em situação de vulnerabilidade social. Fomos visitá-los e tivemos a oportunidade de conhecer o trabalho da instituição, que é séria e uma referência no município no cuidado ao idoso. Por termos visto o nível de necessidade da instituição (cujas demandas são variadas e constantes – principalmente por produtos de higiene pessoal, carne e frutas) e conversando com os responsáveis pela administração, nos relataram essa dificuldade de manter a conta da padaria em dia [eles consomem, mensalmente, cerca de 1428 unidades de pães tradicionais e 25 unidades de pão integral, o que faz com que a conta mensal de padaria fique em torno de R$ 750,00]. Então acabamos por optar por essa ação social neste ano. O lixo eletrônico entra nessa história da seguinte maneira: todo material coletado é recolhido por uma empresa parceira, o Edinho Sucatas, que pesa o material e paga um preço fixo, de acordo com a quantidade de material recolhida. Ele nos paga por esse material e esse dinheiro é depositado na conta do Núcleo da Mulher, cujo objetivo é arrecadar os R$ 9.000,00 para custear um ano de padaria do asilo”, detalha Camila, sobre a decisão de ajudar esta instituição em especial.